Uma vez um fã do blog me perguntou no MSN: "Por que você não fala das outras companhias, como Sony e Microsoft?", e em vários comentários também já vi coisas como: "Por que você só fala mal da Nintendo?". Eu lembro que respondi ao fã: "Mas não é óbvio? É a única de quem vale a pena falar".
O fato de eu perseguir tanto a Nintendo é porque ela é a única que eu acredito ainda ter alguma chance de ser excepcional. Foi a única que sobrou. É muito pior quando eu nem mesmo falo a respeito de alguma empresa, significa que ela não é muito interessante. E a Nintendo é bem interessante.
A maioria das pessoas acredita que uma afirmação dessas é repleta de parcialidade e fanatismo, mas é muito mais questionável o mágico mundo do arco-íris onde as pessoas que acusam as outras de parcialidade vivem. Um mundo onde todas as empresas tem qualidades e defeitos que as tornam igualmente especiais, como se a vida fosse um episódio dos Ursinhos Carinhosos.
Quando começaram a me chamar de fanático da Nintendo por isso, não fazia muito sentido, pois eu tinha vários consoles e os adorava. Na verdade, sempre gostei mais do meu Dreamcast e PlayStation One que do meu Nintendo 64, mais do Master System que do Nintendo 8 Bits. Ah, então eu era um fanático da Sega. Mas eu também não era muito fã do Saturno, apesar de ter um.
No entanto, o ponto de base é que eu não gostava muito da Sony e Microsoft. Os fóruns e outros jogadores tentam fazer você acreditar que é errado não gostar de alguma empresa, que esse preconceito é sempre algo irracional e que a imparcialidade vem da utopia de que todas são especiais do seu jeitinho.
Obviamente eu nunca aceitei essa versão e parti para descobrir o que me incomodava. Era muito difícil fazê-lo, pois eu demorei para entender tanto de jogos quanto eu entendo hoje, e não sabia verbalizar muitas das frustrações, apenas sentia que algo estava errado. Felizmente eu aprendi bastante com Sean Malstrom, não coisas que eu não sabia, mas a como expressar muito do que eu não conseguia colocar em palavras.
Foi então que eu descobri por que eu não gostava muito da Microsoft nem da Sony, porém apreciava Nintendo, Sega e até mesmo o antigo Atari.
O segredo estava na cultura de jogos. Há dois tipos de cultura, a proveniente dos fliperamas, a cultura arcade, e a que veio dos computadores, a cultura dos PCs.
Atari, Sega e Nintendo, fazem parte da cultura arcade. Seus jogos começaram em fliperamas, ambientes vivos onde eles tinham que provar seu valor e seriam pesadamente julgados pelos jogadores e donos dos estabelecimentos. Eles dependiam dos jogadores, os jogadores eram seus reis.
Enquanto isso, a cultura do PC apelava para jogadores nerds isolados, não precisava agradá-los, eles consumiriam qualquer coisa eletrônica que dissesse que os tornaria especiais. Os jogadores dependiam deles, os jogadores eram seus súditos, e por que não dizer, escravos?
Desde então, o mercado de jogos se molda sobre essas duas faces culturais. Arcade e PC, uma servindo ao jogador, a outra o explorando. Até o fim, a Sega manteve suas raízes, e a Nintendo ainda as mantém também.
Durante o primeiro PlayStation (do qual eu gostava, novamente confundindo os rótulos), a Sony ainda não sabia o que estava fazendo, e ela não tinha cultura própria, aproveitando a cultura bastante remanescente do Super Nintendo que as third parties traziam. Porém, mais tarde, no PlayStation 2, a empresa tentou desenvolver sua própria cultura, a qual me desagradou e se afastou da cultura arcade.
No entanto, as coisas ainda não estavam tão ruins como quando o primeiro Xbox foi lançado. Por pior que eu pudesse achar a cultura do PlayStation 2, ela era própria. Todo console até então trazia sua cultura e enriquecia a indústria de alguma forma. Então o Xbox trouxe a cultura do PC para os consoles.
Se hoje temos videogames com sistemas operacionais que precisam de atualização, HDs, instalação de jogos, foco extremo em títulos de tiro em primeira pessoa, jogos incompletos para vender expansões, entre tantos outros perrengues, é culpa da entrada do primeiro Xbox e sua cultura de PC.
Dentre as duas culturas, há uma que é a correta a se seguir, a arcade.
A cultura do PC foca-se em um nicho e é canibal, isola o jogador naquele mundo e nunca se expande, ela cria uma espiral de oceano vermelho, sempre se focando nos mesmos jogadores, até esse grupo naturalmente encolher. Ela é, por sua própria natureza, auto-destrutiva.
A cultura arcade, por outro lado, promove interação entre todas as pessoas, conquista por cativação de novos jogadores, acessibilidade e expansão do mercado em um oceano azul de novas possibilidades. A cultura de PC pode coexistir com ela para atender as necessidades de um nicho, os hardcores. Porém, se a cultura de PC se torna o foco ao invés da arcade, a indústria ruma para sua própria destruição.
O Wii e o DS foram primores da cultura arcade, mas a Nintendo está um pouco perdida agora. Até mesmo ela precisa levar puxões de orelha de vez em quando.